Aprovação da LEI 13.846/2019 e seu reflexo nos RPPS

 

Publicado em: 29/10/2019 09:56 | Fonte/Agência: ABIPEM

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Aprovação da LEI 13.846/2019 assegura mais responsabilidade, segurança e governança aos RPPS

Nos primeiros dias deste mês, em 3 de junho, o plenário do Senado Federal aprovou a Medida Provisória 871, que versa sobre a Lei 9.717/98, por meio do Projeto de Lei de conversão nº 11 de 2019. Narlon Gutierre Nogueira, secretário adjunto da Secretaria de Previdência do Ministério da Economia, declarou que: “sem dúvida representa um grande avanço em relação à governança dos Regimes Próprios de Previdência Social e à responsabilização de todos aqueles que atuam na gestão e na supervisão dos RPPS. Nós agora, vamos aguardar que esse Projeto seja sancionado e publicado e também na sequência a aprovação da PEC nº 6 de 2019 para que nós tenhamos, então, a nossa tão desejada Lei de Responsabilidade Previdenciária”. A LEI 13.846/2019 foi sancionada ontem, 18, e pode ser acessada, aqui.

Para Majoly Hardy, Coordenadora do Copajure, uma boa novidade da MP versa acerca da alteração que foi promovida no artigo 96 da Lei Federal 8.213, que se refere à expedição, à averbação de tempo, mediante certidão de tempo de contribuição. “O que ela trouxe de novidade, que hoje só está na portaria 154 de 2008, do antigo Ministério da Previdência Social, e também na Instrução Normativa nº 77 de 2015, foram algumas dessas normas que estavam nessa portaria e nesta instrução normativa. Agora, isso foi colocado em Lei, o que juridicamente tem um peso muito importante, pois podemos discutir a hierarquia das Leis e a força normativa que cada uma dessas disposições têm. Muitos advogados alegam que, enquanto não está em Lei, não tem força obrigatória nenhuma. Então, isso é uma novidade boa para os Regimes Próprios. Assim que for sancionada a conversão da MP em Lei, vai ficar escrito que a certidão por tempo de contribuição só pode ser expedida, por exemplo, para esse servidor. A importância disso é que há muitos municípios que expedem certidão por tempo de contribuição de um período que não está sendo contado para fins de aposentadoria sem que o servidor tenha quebrado esse vínculo. A expedição é um controle maior na contagem do tempo de serviço do servidor”, finaliza.

Outro assunto interessante são alterações bem impactantes envolvendo os RPPS e os entes federativos em relação à Lei Federal 9.717/98. A primeira delas que houve alteração nessa Lei, no artigo 1º, parágrafo 2º, onde trata, agora, que é possível a realização de compensação previdenciária entre RPPS ou entre o RPPS e o Regime Geral.

Novidade também no artigo 6º da lei federal 9.717/98, que igualmente foi introduzido pela MP 871, no que se refere ao parágrafo único e os incisos desse parágrafo. Mojaly afirma que a inovação “foi bastante positiva e bastante séria que versa sobre a aplicação dos recursos dos RPPS está, agora, regulamentada em Lei que exige seriedade, gestão e práticas de controle das instituições públicas ou privadas que administram esses recursos. Ou seja, as instituições financeiras, que vão receber esses recursos para fazer a administração deles”.

Sobre este tópico, Paulo Di Blasi, consultor de investimentos, professor de pós-graduação e MBA da FGV e do IBMEC, também avaliou positivamente a MP. Segundo ele, tal medida será boa para o bolso do Regime Próprio, pois “aprimora o modelo fiduciário, que é todo o arcabouço institucional e regulatório que dá segurança ao processo de investimentos. Deve haver um período de adaptação no horizonte de todos os regimes do País. Acho importante nesse ínterim, nessa janela que a legislação continue com a salvaguarda que ela colocou, pois são positivas no atual momento para regular as aplicações dos Regimes. A legislação vai proteger o capital dos RPPS para melhor proteger o capital público. Consolida e deixa claro a solidariedade do sistema”, encerra.

França, da Privatiza, explica que a alteração trouxe mais responsabilidade aos agentes envolvidos na seara, pois será necessária uma melhor pesquisa dos membros que serão colocados nos conselhos e nos comitês: “Quem for incluído no time de participantes do comitê de investimento, por exemplo, deve estar ciente da responsabilidade que assumiu. Do lado do mercado, todos nós temos que ter ciência que devemos ser diligentes, procurando apresentar produtos que façam sentido, que não tenham vício de origem de credibilidade. A partir da legislação – distribuidores, gestores, consultores, administradores – todos os participantes do mercado envolvidos na cadeia de produtos de servidos oferecidos ao RPPS têm responsabilidade por eventuais danos que ocorreram fora dos padrões de mercado’’. afirma.

A elevação substancial dos níveis de governança, haja vista que deve ter um quadro mais técnico com as devidas certificações, entre todo o mercado financeiro coloca na linha de punição da eventualidade de usar a má fé ou induzir que possam levar à falência dos RPPS.

Majoly esclarece que tal decisão não tinha na lei federal 9.717/98. E isso exige que ocorra preservação de critérios de boa qualidade de gestão, de controle interno, histórico e comprovação de atuação. “Isso quer dizer que o gestor de RPPS não pode ficar decidindo os gestores que irão administrar os recursos previdenciários ou da taxa de administração conforme sua própria vontade e interesse. Agora, é exigido olhar e atender a critérios que estão discriminados na lei e não apenas em resolução do Conselho Monetário Nacional. Gestores podem ser responsabilizados por isso”.

 

Impactos do artigo 8º da Lei Federal 9.717/98

 

Outra novidade está no artigo 8º da Lei Federal 9.717/98, que fala a respeito de os dirigentes da unidade gestora dos RPPS, os membros do conselho administrativo e fiscal, e membros de comitês. Eles responderão diretamente a qualquer infração que causarem. Majoly esclarece será aplicado o regime disciplinar de infrações da Lei Complementar 109/ 2001, que “é muito mais exigente em termos de gestão, o caput do artigo 8º está dizendo que os gestores dos Regimes Próprios, os membros dos conselhos, dos comitês serão responsabilizados, sim, por qualquer infração que possam vir a cometer frente a Lei Federal 9.17/98”, disse.

O mais interessante da medida é que não são apenas os gestores, presidentes ou membros de conselhos administrativo e fiscal ou de comitês de investimento que vão responder. Quaisquer profissionais que prestem serviços técnicos para o ente federativo, estado, município, Distrito Federal ou União, ou para o RPPS diretamente ou por intermédio de pessoa jurídica contratada também se torna responsável”, informa.

Ainda sob o artigo 8º, Majoly explica que os dirigentes do ente federativo instituidor do Regime Próprio ou da unidade gestora e todos aqueles que são consultores distribuidores, instituição financeira, administradora de carteira, gestora do fundo de investimento que recebeu recurso serão solidariamente responsáveis na medida de sua participação pelo ressarcimento do prejuízo decorrente de aplicação em desacordo com a legislação vigente. Isto, para ela, é o ponto mais importante da Lei.

“Em tempos onde a prática de boa gestão, de governança e de controle interno estão cada vez mais presentes e são mais exigentes não se pode admitir que os recursos sejam investidos em fundos onde as pessoas que estão dando orientação saibam que são fundos ‘micados’, ou seja, fundos de investimentos com problemas, que vão ter rentabilidade muito mais baixa ou que têm risco de crédito muito maior que outros fundos que oferecem riscos menores e rentabilidade maior”, esclarece Majoly.

Para ela, o artigo 8º é um dos mais importantes, pois evita a prática de Caixa 2, gestão dolosa e fraudulenta dos recursos A segunda novidade mais importante que versa sobre controle é o artigo 9º que foi totalmente remodelado. “Uma das maiores novidades é o inciso 4º que diz que compete à união a emissão do Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP), que atestará, para os fins do disposto no art. 7º desta lei, o cumprimento, pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, dos critérios e exigências aplicáveis aos regimes próprios de previdência social e aos seus fundos previdenciários”, conclui.

 

Entrevista

Abaixo, segue ping-pong com Magadar Briguet, consultora jurídica da ABIPEM, explica mais sobre essa aprovação.

1) Qual a importância da aprovação da MP 871 para a Previdência?
R. A MP faz parte da reforma da previdência, na medida em que estabelece mecanismos de eliminação e prevenção de fraudes previdenciárias, sob vários aspectos, institui instrumentos para aperfeiçoamento de dados e informações sobre segurados da Previdência Social e critérios para ressarcimento ao INSS de benefícios pagos indevidamente.
Basicamente, institui dois programas especiais, com duração determinada: o especial para análise de benefícios com indícios de irregularidade e o de revisão de benefícios por incapacidade, sem prejuízo de prever a revisão permanente na concessão e manutenção de benefícios previdenciários.
É claro que qualquer revisão de benefício previdenciário tem repercussão na esfera de interesse dos beneficiários, de sorte que deve ser feita segundo os critérios definidos em regulamento, observado, sempre, o devido processo legal. A MP dispõe sobre essa questão.

2) Esses programas têm repercussão nos RPPS?
R. Não. Os RPPS dos entes federativos têm a disciplina da concessão e manutenção dos benefícios previdenciários prevista em lei específica. Entretanto, importante registrar que a revisão dos benefícios previdenciários decorre da prerrogativa de que goza a Administração Pública, de autocontrole se seus próprios atos, assegurada pela Súmula 473 do STF. Vale dizer: as leis previdenciárias contam com a previsão de revisão dos benefícios de incapacidade, por ex., para verificação de permanência das causas que os ensejaram. Em sendo verificada a ausência dessas causas, o servidor é revertido para o cargo no qual se aposentou.
Nada impede, porém, que o ente federativo possa instituir um programa especial de revisão.

3) Os bônus instituídos na MP para os servidores que irão executar esses programas podem ser estendidos aos RPPS?
R. Não automaticamente. Qualquer vantagem pecuniária prevista para os servidores públicos em geral, deve estar prevista em lei própria (art. 37, X; 169, § 1º, da CF), bem como atender aos requisitos orçamentários específicos.

4) Há critérios para estabelecer quais são os processos que serão abrangidos pelos programas?
R. Sim. Na MP consta que os processos são identificados por critérios técnicos e já foram objeto de questionamento por outros órgãos públicos, como TCU, CGU, MP federal e outros.

5) As alterações previstas para as pensões por morte de servidores federais passam a ser automaticamente observadas pelos regimes próprios?
R. Não. Cada ente federativo, considerando sua autonomia constitucional, deve prever, em lei própria, as alterações relativas à concessão da pensão por morte de seus servidores, sendo sempre recomendável que siga os parâmetros federais.

6) São previstos critérios para união estável dependência econômica para concessão da pensão por morte. Devem eles ser seguidos pelos RPPS?
R. Nos termos do § 12 do art. 40 da CF, que institui o princípio da convergência entre os regimes, é possível, sim, quando o ente federativo não conta com critérios estabelecidos em regulamento, utilizar-se de critérios objetivos para a correta concessão da pensão por morte. Atualmente, muitos entes já se utilizam dos critérios estabelecidos pelo regime geral, no Decreto no. 3.048/99, para a verificação da união estável e dependência econômica.

7) Qual a novidade em relação à emissão de CTC para os RPPS?
R. Por força da contagem recíproca prevista constitucionalmente (art. 201, § 9º, da CF), a CTC deve ser expedida de acordo com os critérios definidos pelo RGPS em sua lei e respectiva regulamentação.
Atualmente, os RPPS seguem os procedimentos estabelecidos na Portaria 154, de 2008, e atualizações, do MPS, para a emissão de suas respectivas certidões.
O art. 96 da Lei no. 8.213, de 1.991, põe fim à polêmica criada em torno do aproveitamento, pelo servidor, de sua contribuição ao RGPS, mas vinculado ao ente público, para aposentar-se junto ao Regime Geral, e aposentar-se junto ao RPPS, com o tempo de contribuição a esse regime.
Com a nova redação, fica definido na lei o que antes era objeto de regulamento e nota técnica da Secretaria de Previdência, ou seja, que a CTC só pode ser expedida quando o servidor não tem mais vínculo com a Administração Pública, ou seja, ex-servidor.
De igual modo, pacifica-se a questão tormentosa de que é vedada a desaverbação de tempo de contribuição ao RGPS, que tenha gerado a concessão de vantagem remuneratória ao servidor em sua situação funcional. Assim, o servidor não poderá mais ser ativo e inativo em relação à mesma atividade, com prejuízos aos RPPS que ficavam privados da compensação previdenciária em relação ao período em que o servidor esteve submetido ao RGPS, mas vinculado ao ente federativo.
Em suma, o tempo de contribuição ou de serviço é patrimônio do servidor, mas está vinculado a uma determinada situação funcional.
Importante também mencionar que a MP traz a obrigação de serem indicados na CTC os períodos de tempo de contribuição na atividade especial, para fins de concessão da aposentadoria especial.

8) O que muda para os RPPS, diante das disposições contidas no art. 31 da MP?
R. As disposições do art. 31 da MP dizem respeito às alterações introduzidas na Lei 9.717/98, que dispõe sobre normas gerais para o funcionamento e organização dos regimes próprios, de obrigatória observância pelos entes federativos, nos termos do art. 24, XII e § 1º, da CF.

Estão previstos em lei critérios que atualmente constam em atos normativos, em relação à aplicação dos recursos previdenciários, com o objetivo de que essas aplicações sejam feitas com segurança, proteção e prudência financeira.

Está previsto o regime disciplinar da LC 109/2001, no que couber, pela infração à lei, para os dirigentes, membros de conselho e comitê de investimentos, bem assim os consultores.
Tal regime disciplinar está previsto nos arts. 63 e seguintes, que estabelecem:

Art. 63. Os administradores de entidade, os procuradores com poderes de gestão, os membros de conselhos estatutários, o interventor e o liquidante responderão civilmente pelos danos ou prejuízos que causarem, por ação ou omissão, às entidades de previdência complementar.
Parágrafo único. São também responsáveis, na forma do caput, os administradores dos patrocinadores ou instituidores, os atuários, os auditores independentes, os avaliadores de gestão e outros profissionais que prestem serviços técnicos à entidade, diretamente ou por intermédio de pessoa jurídica contratada.
Art. 64. O órgão fiscalizador competente, o Banco Central do Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários ou a Secretaria da Receita Federal, constatando a existência de práticas irregulares ou indícios de crimes em entidades de previdência complementar, noticiará ao Ministério Público, enviando-lhe os documentos comprobatórios.
Parágrafo único. O sigilo de operações não poderá ser invocado como óbice à troca de informações entre os órgãos mencionados no caput, nem ao fornecimento de informações requisitadas pelo Ministério Público.
Art. 65. A infração de qualquer disposição desta Lei Complementar ou de seu regulamento, para a qual não haja penalidade expressamente cominada, sujeita a pessoa física ou jurídica responsável, conforme o caso e a gravidade da infração, às seguintes penalidades administrativas, observado o disposto em regulamento:
I – advertência;
II – suspensão do exercício de atividades em entidades de previdência complementar pelo prazo de até cento e oitenta dias;
III – inabilitação, pelo prazo de dois a dez anos, para o exercício de cargo ou função em entidades de previdência complementar, sociedades seguradoras, instituições financeiras e no serviço público; e
IV – multa de dois mil reais a um milhão de reais, devendo esses valores, a partir da publicação desta Lei Complementar, ser reajustados de forma a preservar, em caráter permanente, seus valores reais.
§ 1o A penalidade prevista no inciso IV será imputada ao agente responsável, respondendo solidariamente a entidade de previdência complementar, assegurado o direito de regresso, e poderá ser aplicada cumulativamente com as constantes dos incisos I, II ou III deste artigo.
§ 2o Das decisões do órgão fiscalizador caberá recurso, no prazo de quinze dias, com efeito suspensivo, ao órgão competente.
§ 3o O recurso a que se refere o parágrafo anterior, na hipótese do inciso IV deste artigo, somente será conhecido se for comprovado pelo requerente o pagamento antecipado, em favor do órgão fiscalizador, de trinta por cento do valor da multa aplicada. (Vide Súmula Vinculante nº 21)
§ 4o Em caso de reincidência, a multa será aplicada em dobro.
Art. 66. As infrações serão apuradas mediante processo administrativo, na forma do regulamento, aplicando-se, no que couber, o disposto na Lei no 9.784, de 29 de janeiro de 1999

Importante destacar que as infrações serão apuradas mediante processo administrativo, assegurados aos acusados ampla defesa.

Releva considerar que os prejuízos causados pela aplicação dos recursos em desacordo com a legislação vigente deverão ser ressarcidos, em regime de responsabilidade solidária, pelos dirigentes do ente federativo, da unidade gestora e os demais responsáveis pelas ações de investimento e aplicação dos recursos, inclusive, consultores, distribuidores, a instituição financeira administradora da carteira, fundo de investimentos que tenha recebido os recursos, bem como seus gestores e administradores.

Estão definidos na MP os requisitos mínimos para ser dirigente ou conselheiro de regime próprio, de maneira a impedir nomeações de pessoas que não têm a habilitação e capacidade para gerir regime próprio.
À Secretaria da Previdência é concedida atribuição de apurar infrações e aplicação das penalidades previstas na MP.

Ressalte-se, ainda, importante previsão na MP, da emissão do CRP, que atesta o cumprimento pelos entes federativos dos critérios e exigências aplicáveis aos RPPS. Com essa medida, coloca-se fim à discussão da legalidade do Certificado, que estava previsto em decreto.

9) O que muda na compensação previdenciária?
R. O art. 8º A da lei 9.796/99 é alterado para dispor sobre a instituição de regulamento para a compensação entre os regimes próprios, inclusive quanto ao estoque, forma de pagamento e parcelamento. Há previsão de que o ente que não aderir à compensação entre os regimes, terá suspenso o recebimento dos valores devidos pela compensação com o RGPS.